sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O cemitério é logo ali

Na edição do dia 16 do jornal Diário do Sudoeste, um artigo chamou-me a atenção por duas razões, uma delas foi o título um pouco estranho e porque não dizer, “tétrico”, mas também pelo fato de ser escrito por uma pessoa que tenho grande admiração. Moraes Rodrigues é um ícone do rádio sudoestino, dono de uma bela voz e um comunicador extremamente sério e centrado em seus comentários. Por esta razão entrei em contato com o autor do artigo e solicitei sua autorização para a divulgação deste texto em meu blog. Não esperava nada diferente de uma pessoa tão educada quanto Moraes Rodrigues, agradeço pela sua atenção e resposta afirmativa.

Por Sebastião Moraes Rodrigues

Na última semana optei por trocar a noite sossegada do meu bairro pela agitação frenética da Avenida Tupi, só para constatar, in loco, o que a televisão e o jornal haviam mostrado. Eu queria ‘ver para crer’, como um incrédulo São Tomé. A gente sempre julga que a Imprensa carrega nas cores mais berrantes. Eu fui de curioso meter o dedo na ferida, mesmo. Confesso a você que me arrependi de ter trocado a tranqüilidade do meu lar por aquele sinistro ambiente. Para chegar ao ‘point’ da rapaziada, tive que acompanhar lentamente uma procissão que, seguia ironicamente em direção ao cemitério municipal do Bortot.  Perguntei-me: Porque esse pessoal estaria indo para o cemitério numa hora dessas? Nesse cortejo havia gente inebriada pela bebida, sufocada pela fumaça e anestesiada por uma mistura de ruídos, sons e gritos, como quem vai para o sacrifício final. Não vi a prazerosa alegria naqueles rostos jovens. Pareceu-me que eles estavam sendo empurrados para um abismo, naquele rodamoinho frenético que se forma naquela região, nos finais de semana.  Lembrei-me logo do escritor florentino, Dante Alighieri, em sua obra “A Divina Comédia”, descrevendo o inferno, na sua célebre trilogia. Observando aquele cenário, fui repentinamente assaltado pela frase que o famoso poeta, italiano lapidou na porta do inferno: “Lasciate ogni speranza, voi ch’entrate”. (Deixai aqui toda a esperança, ó vós que estais entrando). Seria aquilo ali uma visão inferior, pra não dizer infernal, diante dos meus olhos?  Não é possível que em nossa cidade esta peça dantesca seja encenada em todos os finais de semana e nós não façamos nada! São centenas de jovens que entram enganados pelo portal da morte, imaginando encontrar após a soleira, a felicidade, a alegria e a vida. Vi também a força policial fazendo seu papel, impotente diante do número de presentes, misturados entre garrafas, latas de cerveja, litros e um ruído marcado e cadente que doía aos ouvidos, vindo de vários pontos. Belas jovens cheias de vida e beleza, mas, vazias de conteúdo e felicidade, anestesiadas pela falsa alegria que transbordava daquelas garrafas de ilusão. O que eu vi assemelhou-se a uma cena apocalíptica, funesta, funérea até. No ar, um odor fétido de urina e bebida. No chão, restos de um irresponsável fim de festa. Vi o que não queria ter visto: jovens, na flor da idade, aproximando-se perigosamente do cemitério.

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